Crônicas Lunares — Um começo promissor, mas um fim de tirar a alegria

Jey Canavezes
7 min readJan 6, 2023

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*Esse texto contém spoiler*

Crônicas Lunares é uma série de livros de 2012 e eu até acompanhei os lançamentos aqui no Brasil, mas demorei muito tempo para concluir a série, devido a alguns problemas que eu tive com a edição física dos livros. Acredito que se eu tivesse lido na época eu teria gostado por ser jovem e ter pouca bagagem literária.

A Marissa Meyer tem se tornando uma escritora constante na minha lista de leitura por ela só escrever fantasia, eu comprei até o romance pré-adolescente que ela escreveu. Mas eu devia ter ficado com a memória afetiva que eu tinha de Crônicas Lunares. A história teve um começo incrível e Cinder e Scarlet estão entre os meus favoritados, mas Cress e principalmente Winter são de doer os olhos. E não é um problema com as personagens que dão nome aos livros é a falta de vontade da autora de desenvolver a história, principalmente o mundo que ela criou.

O primeiro livro situa a história principal que gira em torno de Cinder uma ciborgue que descobre ser a princesa perdida de Luna. Agora ela precisa derrubar a sua tia tirana do poder, achar a cura para a doença que assola a Terra e descobrir se o príncipe Kai quer namorar uma menina ciborgue. Uma situação bem interessante no livro é que os lunares conseguem se reconhecer se as pessoas são ou não de Luna pela energia que emana deles assim como também reconhecem os lunares que não emitem essa energia e são chamados de cascudos. Ao final do primeiro livro Cinder é condenada a prisão pela rainha Levana por ser considerada uma fugitiva de Luna, mas ela consegue fugir e inicia a sua busca por respostas sobre si mesma.

O que nos leva ao segundo e melhor livro que é Scarlet. A história de Scarlet e Lobo é a mais obvia possivel, mas também é a clichezinha menos problematica. Ela se apaixona por um cara que tem como missão seduzi-la e obter informações enquanto os “colegas” dele estão torturando a sua avó para descobrir a localização da princesa perdida. Scarlet passa boa parte do livro sendo insuportavel, principalmente porque a avó dela sumiu e pelo que parece foi levada por pessoas barra pesada e ela fica numa ladainha sem fim de que a avó dela é só uma velhinha fazendeira. Mano, se alguém sequestra a minha avó e fala que ela sabe de coisas, eu vou com certeza acreditar que eu não sei quem é a pessoa que vive comigo. Um milhão de evidencias na cara da Scarlet e ela “mas vovó planta tomate”… ela tinha era que ter plantado a mão na sua cara pra tu deixar de ser tonta! Contudo eu ainda gosto do desenvolvimento todo errado do relacionamento da Scarlet com o Lobo, e fico toda boiolinha quando o ele diz que Scarlet é a alpha dele. Não faz o menor sentido, mas é muito fanfiqueiro. Eu sei que você sentiu o cheiro aí da sua casa. Enquanto isso Cinder estava em busca de pessoas que tiveram relação com a sua adoção, entre essas pessoas uma senhorinha que foi piloto em um missão em Luna.

Em Cress o negocio começa a desandar completamente. Cress é a hacker responsavel por espionar os governantes da Terra para Levana, mas equipe de protaginistas decidiu resgata-la do satélite onde ela vive. Mas o satélite cai e ela e Thorne acabam no meio do deserto tendo que começar um processo absurdamente torturante de se conectarem para futuramente serem um casal que faz o minimo de sentido. Não rolou. Foi chato e eu queria que eles morressem de queimaduras solares. É sério. Enquanto isso Cinder estava bolando um bom plano para voltar para Luna, assumir como rainha destronando Levana, curar a letumose e dar uns beijos no Kai? Não. Ela estava sentindo pena dela mesma. Enquanto chorava que a Scarlet foi sequestrada. Próximo livro. É sério acabou. Esse livro é um grande nada.

Enquanto isso Winter é simplesmente tudo ao mesmo tempo! TUDO! Eles foram para Luna, rebelião, reencontro, morte, revelações, casamento, tentativa de homicídio, descasamento, nova coroação, novas alianças, humanos peitando lunares, Cinder comendo o rabo da madrasta dela com areia… Cacete, que livro longo! E tudo isso pode parecer empolgante, mas na verdade ou as coisas aconteciam do nada ou demoravam páginas e capítulos para acontecer. Por exemplo, a Cinder chegou em Luna dizendo “e aí, galera, sou sua princesa perdida. Abaixo a tirania!” e todo mundo seguiu a doida! Assim. De graça. Sem ela fazer nada para merecer a confiança do povo. Por outro lado tinham cenas que demoravam páginas e só serviam para desacelerar a história, como o capitulo que a Cinder ficou tentando se consertar e descobriu que o sistema ciborgue dela parou de funcionar e só uns 10 capítulos depois a gente descobriu que isso significava que ela não era mais imune ao dom lunar… PORQUE A LUTA FINAL TINHA QUE SER NA RAÇA! AHPAPORRA!

Pra mim, tirar a vantagem de um protagonista na luta final para um mano a mano é tão ruim quanto o plot do amor verdadeiro. Cacete de amor cura tudo. Cacete de “igual pra igual”. Tem vantagem é pra usar vantagem mesmo. Por isso eu AMO aquela cena final de Capitã Marvel em que o cara desafia ela pra cair na mão e ela mete um raio nos peito dele!

Tem muito buraco nessa história, muita coisa aconteceu ou, no caso, não aconteceu e a explicação é simplesmente “porque sim”. Os personagens mal evoluem e as crises politicas desse livro podem ser resolvidas por uma criança de 12 anos com o mínimo de bom senso. Por exemplo, pra mim o pior problema dessa série é: porque ninguém pensou em um método de proteger o cérebro das pessoas do dom lunar? O que passou na cabeça do alecrim dourado do padrasto da Cinder para ter criado aquele dispositivo? E se ele apresentou em uma feira significa que PESSOAS viram, logo, PESSOAS conheciam o projeto e essas mesmas PESSOAS poderiam ter tentado um projeto parecido! Não é possivel que no PLANETA TERRA INTEIRO não tenha tido mais UM, MAIS UM, ser humano que tenha pensado “e se a gente tentar bloquear o dom lunar?”. Não. Só o pudinzinho de coco do Lihn Garan que pensou nessa possibilidade!

Eu digo isso porque 90% dessa série é a Levana dando chilique e ameaçando o povo da Terra por qualquer minimo motivo e ninguém faz nada porque tem medo do poder dela e dos lunares — tanto militar, quanto o dom lunar — é absurdamente irritante como passamos quatro livros lambendo essa personagem sendo que ela não tem um pingo de carisma de vilã. Não é aquela personagem que a gente tem raiva, mas é fodona, ela é insuportável, porque ninguém consegue minimamente desafiar ela. Não há obstáculos para ela nessa história a não ser os que ela mesma inventa como “eu quero que a Terra me escolha como rainha”. WTF? Não tem porque escolherem ela como rainha, não porque ela querer uma aliança pacifica se na realidade ela quer dominar a Terra toda e está disposta a guerrear por isso, sendo que ela poderia controlar a mente de todo mundo para que dessem a “posse” da Terra para ela… Não tem nada que impeça a Levana de nada, exceto, roteiro! Que personagem ruim. Podia ter sido tão melhor construída…

Eu entendi que a Marissa Meyer queria que cada uma das protagonistas tivesse um livro para si e contasse sua história com o seu par, mas ela não desenvolveu a história paralelamente a isso, ela foi empurrando tudo para o último livro e não soube dosar as informações. Cinder chegou e convenceu o povo de que ela era a princesa ao mesmo tempo ela passou dias em Luna sem avançar na sua luta, sem conquistar territorio, pelo contrario ela foi capturada, depois fugiu, depois voltou lá pra lutar, uma bagunça. Não convenceu. Além disso as negociações que ela fez no final com os líderes da Terra foi tão bobo, tudo que ela ofereceu a Terra poderia ter sido exigido de Luna ao longo dos anos de convivencia, mas ninguém falou nada porque “nossa, medo da Levana”, “ela vai dar um chilique e matar mais da metade da população mundial e a gente vai ter que oferecer a cabela de alguém”. A Levana já era rainha da Terra desde o começo do livro, só não tinha título. Fiquei extremamente decepcionada com essa série porque o começo foi incrível, mas não entregou nada no final.

Sobre as polêmicas

Parte da bookrede diz que Crônicas Lunares é uma série cheia de problemáticas. Acabei relendo tendo em vista que hoje em dia eu também não deixaria algo facilmente passar se fosse realmente problemático. Mas assim, acho que as pessoas dão crédito demais para essa série. Se você já leu mais de dois livros, você consegue ver os furos de narrativa e perceber que a Marissa não fez um pingo de estudo para escrever esse livro, pra mim ele surgiu depois de uma maratona de Sailor Moon. Eu não to zoando.

Não que eu esteja passando pano para as questões levantadas, sempre acho importante a gente apontar quando séries e sagas populares acabam reproduzindo de forma velada preconceitos sociais, mas a mesma bookrede que adora apontar um capacitismo aqui, uma transfobia ali é a mesma que fica lendo uma série de livros sobre relacionamentos abusivos e acha o máximo. Tem muita gente que joga livros na fogueira do “cancelamento” porque alguém falou que era ruim e isso afetou a leitura da pessoa.

A questão é, o livro é absurdamente datado e mal escrito. Principalmente porque a maioria dos problemas contidos nele são fruto de uma autora que não pesquisou o mínimo sobre toda uma cultura e que vem de uma época em que a gente achava que sabia ser inclusivo nos livros. A gente passou umas vergonhas no crédito? Sim, mas é porque a gente realmente achava que estava sendo inclusivo e quebrando tabus. Algumas vezes até conseguimos, mas outras só criamos novos estereótipos. Contudo sempre é necessário lembrar e relembrar que livros são frutos de suas épocas e que a maioria deles não tem obrigação moral de educar pessoas. É necessário ter senso crítico para julgar um conteúdo dentro de sua proposta e de sua época.

Outras obras da Marissa Meyer:

Sem Coração — A verdadeira história da Rainha de Copas.

Instant Karma — O romance água com açúcar de Marissa Meyer

Renegados — Decepcionada demais. Adeus, Marissa Meyer

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Jey Canavezes

90% das resenhas são feitas no hype pós-leitura. Os outros 10% eu não tenho ideia do que eu tô falando.